quinta-feira, 26 de abril de 2012

O FEMININO SAGRADO


Lucy Penna (*)
O que a mulher pensa de si mesma é catalisador dos novos rumos. Porque ela guarnece a vida. É a mulher que guarda o germe do futuro na travessia desta transformação política, social e econômica sem precedentes.   A maioria dos profissionais que cuidam das crianças em escolas, maternais, creches é feminina. Dependendo de como forem essas cuidadoras, serão o temperamento, a mente e o espírito dos futuros cidadãos.
Valorizar-se com mais clareza e consciência dos próprios caminhos é uma necessidade urgente, para que a luz da sabedoria feminina se acenda e ajude na construção da nova sociedade. Um rumo que se quer mais solidário, cooperativo, mais terno, com abundância em todos os sentidos. Cuidar dos necessitados, dos menores e dos carentes, eis fortes aspectos da energia feminina que transparecem na história. A psicologia admite que o homem e a mulher tenham potencial para desenvolver tais qualidades de caráter. Os valores que conduziram a sociedade atual, entretanto, foram outros. Privilégios e disputas de poder em todos os níveis superaram a atenção para com os necessitados, sejam crianças ou doentes. A medicina faz hoje um recuo histórico para resgatar o cuidado humanizado, adaptando-o à tecnologia moderna. A psicologia assume erros e lembra princípios antigos de tradições sagradas para ajustar seus conceitos sobre a mulher. Uma retratação necessária porque o descrédito das qualidades psicológicas “femininas” deixou o mundo sem encanto, a religião sem fundamento e a ciência sem esperança.
Como se aplica o feminino? A solidariedade começa na madrugada, quando a pessoa acorda, faz o café, levanta os filhos, abraça a família e sai para o trabalho. O ajuste diário entre obrigações familiares e externas é um desafio constante para todos, que cai, sobretudo nas costas, e no coração das mulheres. Mas seria diferente caso os homens também tivessem consciência da solidariedade. No centro das contradições duras da vida contemporânea há que anunciar bem alto os valores do feminino sagrado: cuidar de si mesmo e dos outros, com máximo carinho.
Não me refiro ao cuidado do aspecto externo, alvo de tanta propaganda. Cuidar de si é valorizar-se como um ser digno de amor. Quem ama a si mesmo não faz concessões ao tipo de consumismo que sangra o corpo e a conta bancária. A verdadeira autoconfiança da mulher está ancorada em saber que a força de propagação da vida está com ela. O homem precisa da mulher para conhecer os mistérios da vida. Meninos e meninas serão melhores se as cuidadoras da infância forem melhores pessoas, com auto-estima elevada, inteiras de corpo e alma. Vivemos ainda um círculo vicioso onde a mulher se banaliza em propagandas vulgares, com poses animalescas. A competição acirra o desejo de sustentar na juventude do corpo o fátuo fogo da felicidade. No limiar do terceiro milênio ainda se podem enganar mulheres que procuram valor pessoal por meio de técnicas cirúrgicas invasivas, como retirar costela, cortar órgãos, inchar os seios, procedimentos que resvalam fácil para resultados enganosos. A personalidade feminina se valoriza de dentro para fora, pela certeza de seu papel central na transformação da sociedade.

 O caráter do homem mais equilibrado articula bem as energias masculinas e femininas. O cuidado nos gestos, o carinho com os filhos e a atenção com os clientes são traços de personalidade que tornam um homem querido. E um profissional bem aceito, requisitado e disputado. Casar amorosidade com atividade, atenção com concentração, escuta com ousadia, satisfação com objetividade é saber integrar as energias femininas com as masculinas.
Quando o que hoje chamamos feminino e masculino for transformado e ampliado, a mulher e o homem se complementarão em beleza e amor. Em lugar de violentar-se para atender às expectativas do homem, a mulher deve procurar compreender o que é, verdadeiramente, ser feminina. O homem está confuso e sofre no corpo e na alma, como a mulher, da violência que é conviver com o lixo acumulado em séculos de uma cultura limitada e limitante.
 A profunda transformação que todos desejamos se apóia na auto-estima de cada um, e no fazer o bem, com boa vontade. A meta é sair da cruz onde estivemos pregados até agora, para ressurgir em alegria, paz e abundância.  Uma abundância que compreende o profano e o sagrado, o corpo e o espírito, a mesa, a cama, o vinho e o pão.

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(*)LUCY PENNA,  psicoterapeuta e autora de livros sobre a psicologia feminina, fundou o Núcleo Junguiano do Cerrado.(http://www.nucleojunguianodo/ http://mail.uol.com.br/compose?to=cerrado@gmail.com)